terça-feira, 8 de julho de 2014

19 – Quando nos Zangarmos


Quando nos zangarmos
vou tentar lembrar‑me
dos momentos calmos
de ternurento lume
em que cada um assume
os enlace dos nossos ramos.

A nossa união ardente
queimará da discórdia
qualquer ato demente;
exorcizará a fúria,
exterminará a incúria,
nada será indecente.

Se nos nossos julgamentos
considerarmos o outro
uma indigna fonte de tormentos,
tentaremos pôr cobro
ao maléfico sopro
dos equívocos pestilentos.

A noção de maldade
vem da base empática
de quem não foge à responsabilidade
com verborreia acrobática
ou com a nebulosa temática
dos mil tons sobre a verdade;

mas também vem da humilde
noção dos sérios limites
do nosso juízo quando decide
em tensões e crises.
Conhecemos, tu e eu, as lides
da vítima e de quem agride.

Faltar‑nos‑á a razão, algum dia,
alternadamente ou em simultâneo.
Creio que ambos temos a sabedoria
para distinguir o profundo do cutâneo;
mesmo considerando o nosso amor instantâneo,
sabemos que nele é eterna a harmonia.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

18 - Amor Terra a Terra


Não há ilusões aqui,
nenhum ideal projetado.
Limito‑me a olhar para ti,
feliz por te ter ao meu lado.
Talvez seja esta química
misturada com a ética

o derradeiro afrodisíaco
para um homem como eu.
Uns acreditam no zodíaco,
no destino que alguém escreveu;
outros verificam listas
de qualidades e caraterísticas;

eu apenas constato
que és mesmo boa pessoa,
dedicada ao bom trato,
à gestão do que magoa,
sem te anulares nem impores
aos outros as tuas cores.

Pedes somente decência,
estética e inteleto;
não tens como referência
fantasias com bom aspeto
para satisfazerem anseios,
caprichos e devaneios.

Valorizamos o concreto
sem anular o desejo;
o nosso deus é o afeto
e a doutrina o beijo.
Neste amor terra a terra,
contra a falsidade é a guerra:

não deixamos as ficções
determinarem os papéis,
as ideias e as ações;
desprezamos os impossíveis
sem estreitar horizontes,
construindo firmes pontes.

Esta lucidez extasiante,
tão viva e alegre,
torna o meu coração gigante;
se há coisa que o regre
é o nosso amor pela verdade
e o teu apego à realidade.